sábado, abril 08, 2006
HENRY E JUNE:Título:
Henry & JuneRealizador: Philip Kaufman
Ano: 1990

Quando era pequeno o meu sonho era ser astronauta. Quer dizer, o que eu queria ser mesmo era escritor, mas se o primeira era difícil, este era mesmo impossível. Escritor é a melhor profissão do mundo; uma vida de boémia, passada nos cafés, a escrever, apenas com o dinheiro suficiente para um whisky no bolso... Realmente, ser astronauta é algo muito mais realista.
Henry E June é Philip Kaufman, novamente, a pregar o seu gosto pela boa literatura. E antes de ter romanceado a vida do controverso Marquês de Sade (em
As Penas Do Desejo), Kaufman já o tinha feito com Henry Miller, outro escritor muito à frente do seu tempo, com uma importante obra dentro universo erótico.
Henry E June é a adaptação romanceada da vida de Henry Miller enquanto escrevia o seu debutante e controverso
Trópico De Câncer.
Anaïs Nin (a nossa Maria de Medeiros, que volta a ter oportunidade de dizer uma fala em português -
se a merda fosse valiosa, os pobres não teriam cu, o melhor ditado de sempre) é uma escritora da alta sociedade francesa, presa na modorra do seu quotidiano. Por isso, quando conhece Henry Miller (Fred Ward), um norte-americano boémio, divertido e controverso aspirante a escritor, Anaïs liberta-se e alarga os seus horizontes. A esposa de Henry, June (Uma Thurman), vai estabelecer a ponte entre ambos, transformando aquela relação num género de ménage à trois obsessiva, em que os horizontes sexuais são, claramente, alargados.
Henry E June é um filme com uma forte dose arty e uma pesada carga poética. O retrato de Miller acaba por ser uma surpresa para aqueles que esperavam um homem com uma libertina relação com o sexo feminino e uma mente explícita; afinal, Miller é mais um homem homem, ou seja, um homem daqueles de bigode farfalhudo, que coçam os tomates e cospem para o chão, num símbolo de virilidade e machismo. Apesar da relação obsessiva deste para com June e a faceta misteriosa desta, o filme centra-se, no entanto, na frágil Anaïs, a quem a experiência da vida é tudo.
Se uma década depois ao olharmos sobre o ombro para
Henry E June encaramos com naturalidade o rol de estrelas no elenco, na altura Philip Kaufman teve a arte e o engenho de descobrir e lançar alguns dos mais fantásticos actores dessa geração: Uma Thurman era ainda uma jovem promissora quando teve aqui uma interpretação bombástica, na dramática e trágica June Miller, que lhe valeu a unânimidade da crítica internacional e, mais importante ainda, o papel de Mia Wallace em
Pulp Ficiton; Maria de Medeiros, que apesar de não ser hoje uma super-estrela, convenceu muito boa gente que ainda duvidavam do seu valor; e Kevin Spacey, apesar do papel secundaríssimo, está fantástico, roubando para si todas as pequenas cenas em que entra. Fred Ward é que já merecia outro filme de jeito...
Henry E June tem, contudo, um claro problema de ritmo. De início, as cenas tendem a acontecer isoladas, vivendo como momentos separados, arruinando a linearidade da história; há momentos em que demoramos a entender se é um flasback, uma prolepse, uma analepse ou um simples encadeamento de cenas. Para o fim isso melhora, mas
Henry E June não consegue nunca arrancar para uma exibição fluída. Tem os seus momentos altos, mas a sua extensão também não ajuda. É como o avião que por demasiado carregado não consegue levantar voo da pista.
Henry E June vale por três coisas: a direcção de actores, a vida de Henry Miller e a faceta erótica do filme, com níveis de testerona elevadíssimos, ou não tivesse Uma Thurman envolvida com Maria de Medeiros mais do que uma vez. Mas não, não é mais do que o McChicken.
Posted by: dermot @
11:03 da manhã
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